Tio Alberto Menini
Tio Alberto - costumava-se dizer - era o mais rico dos meus tios. Tinha uma fazenda grande e uma fazendinha no Saicã. Pelas histórias oralmente transmitidas na família, era também muito bonito, bem vestido e um grande boêmio. Gostava de cavalos de corrida e de carreiras, tanto quanto gostava de jogos, especialmente de jogo de tava ( osso), tão característico da Fronteira do Rio Grande do Sul. Penso, no entanto, que ele gostava mesmo era de dançar - era um verdadeiro pé-de-valsa. Homem sem preconceito, tanto dançava com sua esposa no mais elegante clube da cidade, como dançava em lugares menos elitista, desde que tivessem música - especialmente tangos e boleros - e dançarinas boas e desinibidas. Tio Alberto estudou em Santa Maria. Gostava de ler, tinha muitas informações, foi professor de vários meninos rurais que não tinham acesso à escola e eram analfabetos. Ensinou muitos deles a ler, escrever e contar, objetivos máximos da época. Lembro-me dele usando um terno de linho branco, cuidadosamente passado a ferro, com gravata e lencinho no bolso combinados - moda no início dos anos 50. Meu Tio foi bastante generoso com minha família. Na casa dele, casou minha irmã mais velha; na casa dele, foi também o velório de meu pai. Fez créditos de gratidão comigo.
Casado com tia Salustia ( Salustia Izaguirre Menini ) , nascida em 08 de agosto de 1906, filha de José Angelo Izaguirry e Maria José de Lima. Era uma senhora admirável pela elegância e gentileza: muito presente em casamentos, aniversários, comícios, visita de pêsames, missas e velórios. Quando eu estava com oito anos, meu pai decidiu mandar-me para a cidade, com a finalidade de frequentar uma escola. Acertou com tio Alberto e tia Salustia que eu ficaria morando com eles. Ela esforçou-se muito para fazer de mim uma menina urbana, com muitas prendas e boas maneiras. Colocou-me numa aula de bordado - acreditem que, com 8 anos, eu sabia fazer crivo e bainha aberta? Fui crismada, estudei catecismo, fiz primeira comunhão, fiz discurso para o bispo e declamei poesias em eventos escolares e sociais. Tive vestidos lindos, fui a preferida da professora. Devia, entretanto, ser difícil para meus tios cuidarem e educarem uma menina, com essa idade e nascida rebelde. Ao final de um ano, devolveram-me aos meus pais, acompanhada de uma carta, onde a Tia justificava eu não poder ficar mais com eles porque planejavam ir um tempo para a fazenda, mas pedia que não me tirassem da escola porque eu era muito estudiosa. Meus queridos tios não conseguiram me transformar em uma elegante e fina senhora da época, mas deram considerável impulso na minha autonomia e posterior carreira profissional.
Meus tios foram pais amorosos de Ary Izaguirre Menine, menino que eles adotaram ao nascer e que era filho de Tio Quincas e Leonor. Ary foi criado com todas as regalias de um filho único. Ele foi um dos meus primos preferidos - muito paciente e afetivo. Élida, a primeira esposa dele, era muito afetiva e agradável também. Com dez anos mais do que eu, divertia-se com minhas confusões de criança rural. Uma vez ele me mandou na farmácia comprar Gumex para os cabelos. Fui e voltei dizendo que Gomina não existia! Ele riu e escreveu o nome que eu deveria pedir. Meu vocabulário rural havia sido acrescido de tantas palavras, que por vezes era difícil memorizar a todas. Reencontrei Ary quando já estava bastante doente, e veio visitar-nos na Bela União. Continuava sendo doce e agradável. Saudades!
Consoada
"Quando a Indesejada das gentes chegar
(Não sei se dura ou caroável),
talvez eu tenha medo.
Talvez sorria, ou diga:
— Alô, iniludível!
O meu dia foi bom, pode a noite descer.
(A noite com os seus sortilégios.)
Encontrará lavrado o campo, a casa limpa,
A mesa posta,
Com cada coisa em seu lugar."
Manuel Bandeira
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