quinta-feira, abril 30, 2020

Entrevista de Yuval Harari durante a Pandemia de 2020

Num século que prima pela quase ausência de pensadores como figuras públicas, há alguns anos um historiador israelense se destaca tanto nos círculos intelectuais como nas listas mundiais de best-sellers: Yuval Noah Harari, de 44 anos, é o autor aclamado de Sapiens: Uma breve história da humanidadeHomo Deus: Uma breve história do amanhã e 21 lições para o século 21, lançados a partir de 2014.


    Entrevista  de Harari à  DW -Deutsche Welle - emissora internacional da Alemanha,      que produz jornalismo independente em 30 idiomas

Um de seus interesses centrais é como o homo sapiens, tão distinto das demais espécies animais, alcançou sua condição atual, e qual seu futuro. A história tem uma direção? Há justiça nela? Qual sua relação com a biologia? Os seres humanos se tornaram mais felizes com o desenrolar da história?  Essas são algumas das questões macro-históricas de que se ocupa Harari em sua obra.
Celebridade global também graças a suas palestras online, Harari mora com o cônjuge e agente Itzik Yahav em Jerusalém, e tem também se destacado por adotar posições políticas na contramão do status quo. Sua companhia de impacto social Sapienship doou 1 milhão de dólares à Organização Mundial da Saúde (OMS) em seguida à decisão do presidente Donald Trump de retirar o financiamento dos EUA.
A DW o entrevistou sobre a situação da humanidade em meio às mudanças sociais e políticas em andamento, na esteira da pandemia de covid-19. O historiador acredita que seus futuros colegas verão no atual momento um ponto de mutação na história do século 21, embora "a forma que dermos a ele dependerá de nossas decisões, não é inevitável".
"Mas para tal, temos que tomar consciência do perigo e tomar cuidado com o que permitimos nesta emergência."
DW: Estamos em plena pandemia global. O que o preocupa mais, na forma como o mundo está mudando?
Yuval Noah Harari: Acho que o maior perigo não é o vírus em si. A humanidade tem todo o conhecimento e as ferramentas tecnológicas para vencê-lo. O problema realmente grande são nossos demônios interiores, nosso próprio ódio, ganância e ignorância. Temo que não se esteja reagindo a esta crise com solidariedade global, mas com ódio, colocando a culpa em outros países, em minorias étnicas e religiosas.
Mas espero que consigamos desenvolver nossa compaixão, e não nosso ódio, e reagir com solidariedade global, desenvolvendo nossa generosidade de ajudar os necessitados. E que desenvolvamos nossa capacidade de discernir a verdade, em vez de acreditar em todas essas teorias da conspiração. Se fizermos isso, não tenho dúvida que conseguiremos superar facilmente a crise.
Estamos encarando, como o senhor já disse, a opção entre a vigilância totalitária e a potencialização da cidadania. Se não tomarmos cuidado, a pandemia pode ser um marco na história da vigilância pública. Mas como ser cuidadoso com algo que está fora do nosso controle?
Não está completamente fora de seu controle, pelo menos numa democracia. Você vota em determinados políticos e partidos, que determinam as políticas, portanto tem algum controle sobre o sistema político. Mesmo que não haja eleições agora, os políticos ainda reagem à pressão pública.
Se o público está aterrorizado e quer que um líder forte assuma, isso torna muito mais fácil um ditador fazer exatamente isso: assumir o poder. Se, ao contrário, houver reação do público quando um político for longe demais, podemos evitar que os desdobramentos mais perigosos aconteçam.
Como saber em quem confiar, ou em quê?
Primeiro, há a experiência. Se há políticos que têm mentido para você nos últimos anos, há menos razões para confiar neles nesta emergência. Em segundo lugar, você pode fazer perguntas sobre as teorias que estão lhe contando: se alguém vem com uma teoria da conspiração sobre a origem e o alastramento do coronavírus, peça-lhe para explicar o que é um vírus e como causa doenças.
Se a pessoa não tem a menor ideia, quer dizer que não dispõe de conhecimento científico básico, portanto não acredite em mais nada do que ela está lhe contando sobre a pandemia. Não se precisa de um PhD em biologia, mas se precisa de alguma compreensão científica básica de todas essas coisas.
Nos últimos anos, temos visto diversos políticos populistas atacarem a ciência, dizerem que os cientistas são uma elite remota, desconectada do povo; que coisas como a mudança climática não passam de uma farsa, que não se deve acreditar nelas. Mas neste momento de crise por todo o mundo, vemos que as pessoas confiam mais na ciência do que em qualquer outra coisa.
Espero que lembremos disso, não só durante esta crise, mas também quando ela tiver passado; que cuidemos para dar uma boa educação científica nas escolas sobre o que são os vírus e a teoria da evolução. E também que, quando cientistas nos alertam sobre outras coisas, além de epidemias – como mudança climática e colapso ambiental – ouçamos as advertências deles com a mesma seriedade que temos agora com o que dizem sobre a pandemia do coronavírus.
Muitos países estão implementando mecanismos de vigilância digital para evitar o alastramento do vírus. Como se pode controlar esses mecanismos?
Sempre que se intensifica a vigilância dos cidadãos, isso deve vir de mãos dadas com uma maior vigilância do governo. Nesta crise, os governos estão gastando dinheiro como água: nos Estados Unidos, 2 trilhões de dólares, na Alemanha, centenas de bilhões de euros, e assim por diante. Como cidadão, quero saber quem está tomando as decisões e para onde o dinheiro vai. Ele está sendo usado para resgatar grandes corporações que já estavam em apuros antes mesmo da pandemia, por causa das más decisões de sua chefia? Ou ele está sendo usado para ajudar pequenas empresas, restaurantes, lojas e similares?
Se um governo está tão ávido de ter mais vigilância, esta deve ir nas duas direções. E se ele diz "hei, isso é complicado demais, não podemos simplesmente abrir todas as transações financeiras", você diz: "Não é, não. Do mesmo modo que você pode criar um gigantesco sistema de vigilância para ver aonde eu vou a cada dia, deveria ser fácil criar um sistema que mostre o que você está fazendo com o dinheiro dos impostos."
Isso funciona distribuindo o poder, e não deixando que ele se concentre em uma pessoa ou autoridade?
Exatamente. Uma ideia com que se está experimentando é alertar quem esteve perto de um paciente do coronavírus. Há duas maneiras de fazer isso: um é ter uma autoridade central que coleta informações sobre todo mundo e aí descobre que você esteve perto de alguém com covid-19 e alerta você.
Outro método é os celulares se comunicarem diretamente entre si, sem nenhuma autoridade central que recolha toda a informação. Se passo por alguém que tem covid-19, os dois telefones, o meu e o dele ou dela, simplesmente falam um com o outro, e eu recebo o alerta. Mas nenhuma autoridade central está coletando toda essa informação e seguindo todo mundo.
Possíveis sistemas de vigilância para a crise atual vão um passo mais adiante, no que se chamaria de "vigilância subcutânea". Portanto a pele, como superfície intocável dos nossos corpos, está se rachando. Como controlar isso?
Devemos ser muito, muito cuidadosos a esse respeito. Vigilância sobre a pele é monitorar o que se faz no mundo exterior: aonde você vai, quem encontra, ao que assiste na TV, que sites visita online. Ela não entra no seu corpo. Vigilância subcutânea é monitorar o que está acontecendo dentro do seu corpo. Começa com coisas como a temperatura, mas aí pode partir para a pressão sanguínea, frequência cardíaca, atividade cerebral. E uma vez que se faça isso, é possível saber muito mais sobre cada indivíduo do que em qualquer outra época: você pode criar um regime totalitário como nunca se viu antes.
Se você sabe o que estou lendo ou ao que assisto na televisão, isso lhe dá alguma ideia sobre meus gostos artísticos, meus pontos de vista politicos, minha personalidade, mas ainda é limitado. Agora, pense se você puder realmente monitorar minha temperatura corporal, minha pressão e frequência cardíaca enquanto leio o artigo ou assisto ao programa online ou na televisão: aí você pode saber o que estou sentindo a cada momento! Isso poderia facilmente resultar na criação de regimes totalitários distópicos.
Isso não é inevitável. Podemos impedir que aconteça. Mas para tal, temos que primeiro tomar consciência do perigo, e em segundo lugar tomar cuidado com o que permitimos acontecer nesta emergência.
Esta crise força o senhor reajustar sua imagem do homo sapiens no século 21?
Não sabemos, porque depende das decisões que tomarmos agora. O perigo de uma classe inútil está, na verdade, crescendo dramaticamente, por causa da atual crise econômica. Vemos agora um aumento da automatização, robôs e computadores substituindo seres humanos em cada vez mais empregos nesta crise. Porque as pessoas estão confinadas em suas casas, e elas podem se contaminar. Mas robôs, não.
Talvez vejamos os países decidirem trazer certas indústrias de volta para casa, em vez de dependerem de fábricas em outras locações. Então pode ser que, tanto devido à automatização quanto à desglobalização, especialmente os países em desenvolvimento, que dependem de trabalho manual barato, tenham de repente uma enorme classe inútil de cidadãos que perderam seus empregos, porque estes foram automatizados ou transferidos para outro lugar.
E isso também pode acontecer nos países ricos. Esta crise está causando mudanças tremendas no mercado de trabalho; as pessoas trabalham de casa, trabalham online. Se não tomarmos cuidado, pode resultar no colapso do trabalho organizado, pelo menos em alguns setores industriais.
Mas isso não é inevitável: é uma decisão política. Podemos tomar a decisão de proteger os direitos trabalhistas em nosso país, ou em todo o mundo, nesta situação. Os governos estão resgatando financeiramente indústrias e corporações, eles podem condicionar a ajuda à proteção dos direitos dos empregados. Então tudo depende das decisões que tomemos.
O que o futuro historiador dirá deste momento?
Acho que historiadores futuros verão este como um ponto de mutação na história do século 21. Mas a forma que dermos a ele dependerá de nossas decisões. Não é inevitável.

quarta-feira, abril 08, 2020

Aniversário do Correndomundo

2006/2007 - Torres



Correndomundo completou catorze anos nos últimos dias.    Mais do que um Blog  de Viagem,  ele foi  e é   relato de vida,  registro  de alegrias,  desabafo de  horas   difíceis,  contato permanente com gente querida,  divulgação de meu poeta preferido - Fernando Pessoa - recordação de lugares e de episódios que tento não esquecer.



"Eu amo tudo o que foi,
Tudo o que já não é,
A dor que já me não dói,
A antiga e errônea fé
O ontem que dor deixou,
O que deixou alegria
Só porque foi e voou
E hoje já é outro dia".(Fernando Pessoa, 1931).




Não quero esquecer, por exemplo, que vi os Cavalinhos de Tarquinia

Trouxe do início do Correndomundo o texto seguinte:

"TRANSIÇÕES são dificuldades duríssimas para mim. Abandonar um emprego, trocar de cidade, ser traída por uma amiga, terminar um relacionamento, ver um filho partir, largar tudo, começar tudo, foram passagens doídas, transições sofridas - e sofridas. Nos intervalos dessas transições, já engordei 10 kg em um mês, já fiz pneumonias várias, já tive crises alérgicas terríveis. Mudei. Felizmente mudei. Abandonei as somatizações.Tornei-me mais produtiva. Em períodos difíceis, bordei uma toalha de jantar imensa, em ponto-de-cruz, para a Téssia, em uma semana; em outra crise, teci cinco blusões em dez dias; em outra, viajei durante cinco dias e cinco noites praticamente sem dormir; e, ainda, em uma outra, bordei um tapete de dois metros quadrados em um mês... A transição que faço agora, neste primeiro semestre de 2006, deixando a Bahia depois de sete anos e voltando para o Sul, faz surgir este BLOG....Gugu viajou. Foi para a Alemanha. Depois vai para a Índia. Falo sempre que a vida é isso: uma sucessão de chegadas e partidas. Mas como dói!" Salvador,2006. 



Bahia, 2006.

Assim foi iniciado este blog, em um momento de transição, até de superação. com a partida de meu filho, que sempre havia morado comigo. Foi Gugu que me incentivou a criar um blog - não era  uma mídia comum ainda - e me ensinou como fazê-lo. Eu já começara a pensar em textos e fotos, mas não havia feito duas escolhas necessárias e urgentes: qual seria a denominação do blog e de que temas ele se ocuparia. Lembranças da minha mãe vieram para resolver essas pendências. Ela, entre preocupar-se e orgulhar-se com minhas constantes viagens, respondia quando perguntavam por mim : anda por aí,  correndo mundo! Estava escolhido o  tema e o nome. Seria um Blog de Viagem  e  seria o Correndomundo.



Pedro, meu neto,  em 2016, que se tornaria mais tarde meu companheiro de viagens.

Passaram-se, portanto, 14 anos. Até este ano, Correndomundo tem ao redor de 900 postagens. Nos últimos 5 anos, mais de 400 mil acessos. Não é um blog comercial. Tenho consciência de que é um blog bastante simples. Todas as fotos são feitas por mim, com uma câmera de 200 dólares. Os textos são revisados por mim também - logo erros e acertos são unicamente meus. 



Itália - 2006

Viajar é minha paixão. Gostaria mesmo que todas as pessoas viajassem - não, obviamente, neste momento de coronavirus, quando nossa responsabilidade é manter isolamento social, preservando a vida e a saúde nossa de todas as pessoas.




Agradecimentos contantes aos que lêem meu blog

Escrevi em 2018:  Com a morte da minha irmã caçula, aguçou-se, mais ainda, minha consciência de transitoriedade e de rapidez com que passa o tempo. Não quero me cobrar, nas revisões de vida,  certamente tardias,  alguma viagem que desejei muito fazer e deixei para um vago depois... Sim, sempre ficará algo por fazer. Não acredito num final com " O campo arado, a mesa posta, cada coisa no seu lugar"  



Em Napoli, com inesquecíveis amigos

" ... voltarei a viajar sozinha - tentarei manter os olhos bem abertos para explorar e descobrir. E olhos bem limpos para não sobrepor imagens, como fazem os que comparam um país com outro, ou uma cidade com sua própria cidade. Lugares são como pessoas: únicos , na riqueza de sua diversidade."  https://correndomundo.blogspot.com/search/label/Viagem%3A%20prepara%C3%A7%C3%A3o




2008 - Egito

“Parto com a certeza de deixar para trás motivos suficientes para o não fazer. Mas um sonho tem a força de transformar uma ideia em algo imperativo, inadiável, inquestionável. Aterrorizar-me-ia chegar tarde na vida com a tortura do pensamento: 'quem me dera ter feito aquela viagem…’” 

Alma de Viajante
newsletter@almadeviajante.com



2009 - China - Ronald ( in memoriam )