sexta-feira, agosto 28, 2009

Retorno a Illinois


Levantei cedo. Banho,café,última revisão de bagagens e documentos, choro – parece-me que chorar ao despedir-se de filho é instituição materna – hora de partir.
Valéria me leva até a estação do MARTA. Ao entrar no trem , um pequeno acidente : enfio uma unha do pé no canto da mala. Dói , sangra e me faz esquecer todos os problemas existenciais. Choro de dor. O trajeto até o aeroporto é longo. Vem a calma e até a vontade de rir. Relembro outros tantos desastres , todos oriundos da minha patetice e lerdeza.


Chegada tranquila ao aeroporto. Eu havia feito check in na noite anterior e pago os quinze dólares pela única mala que eu levava. Tudo ok até pesarem minha mala. Passara três quilos do limite. Eu deveria pagar, por esse excesso, noventa dólares. Decidi retirar a mala e tentar diminuir esses miseráveis três quilos . Retirei da mala dois livros, uma bolsa e um sapato. A mala foi pesada novamente. O excesso agora era de 800 gramas. Retirei vidros de vitaminas e uma echarpe. Agora sim: peso exato. Mala despachada.


Começava outro problema: que fazer com todo o “excesso”?
Eu passaria a carregar duas bolsas muito cheias . E a bolsa de viagem, que já estava estourando , recebeu um “reforço”. A saída era jogar fora algumas coisas. Talvez o belíssimo livro , em inglês, sobre o Brasil , que eu comprara na FNAC, em Porto Alegre, como presente para Kevin e esposa? Não! Talvez a embalagem com um pedaço de bolo ( supergostoso) , que Valéria, tão gentilmente, mandara para Ron? Decididamente não! Talvez um sapato meu ( além de novo , custou caro).

Também não! Computador? Câmera? Acessórios eletrônicos? Perfumes? Presentes? Nem pensar! Resolvi carregar tudo!Levar presentes ainda é o meu mais concreto ato de amor. A passagem pela segurança foi um vexame. Precisei de cinco recipientes para acomodar o que passaria pelo RAIO X. E aguentei , com cara de idiota, o evidente desagrado dos que vinham depois de mim. Ultrapassada essa fase, sentei e tentei reorganizar minha superbagagem de mão e reunir forças para carregá-la.


O obstáculo seguinte foi uma escada rolante que me levou ao trem interno. Entrar no trem não foi fácil. Descer idem! Outra escada rolante e entrei no terminal C – portão 52! Longe esse portão. Precisei de três “paradas técnicas”. Quebrei uma unha da mão. Rebentei a correntinha protetora que Ronald me dera para eu viajar ,em razão dos muitos acidentes aéreos. Machuquei um dedo. Pensei comprar uma mala pequena com rodinhas – só não o fiz porque me lembrei das tantas outras vezes que fizera o mesmo e da coleção de malas que disso resultara. Encarei!
Enfim, cheguei sã e salva ao portão de embarque. Agora é só entrar e sair do avião em Bloomington, onde me espera Ron.
Várias vezes eu ri, em meio a todas as dificuldades, porque veio, de algum cantinho da minha memória, um “versinho”que uma tia minha costumava cantar , ao final da história triste de uma moça que desejava muito casar e , pagando uma promessa, enfrentava o frio e a chuva. Era assim:
“Dorme corpinho arrenegado
Hoje tu estás com frio
Amanhã , tu estás casado”.

Quando eu voltar – e nas minhas próximas viagens – Ronald estará comigo.

terça-feira, agosto 25, 2009

Auguri!

Amanhã é o aniversário do meu filho, Paulo de Tarso, a quem eu chamo de Patati. Talvez essa data tenha desencadeado tanta nostalgia, tantas recordações, que me impediram de dormir. Noite longa e insone! Rememorei o dia anterior ao nascimento dele, 25 de agosto. Trabalhei , nesse dia, durante três turnos - eu estudava e tinha três emprego. À noite, no terceiro turno de trabalho, consegui dar as quatro aulas programadas. Cheguei em casa às 22h30min. Havia entrado, prematuramente, em trabalho de parto.
Eram , ainda , tempos duros de repressão. A memória do 1964 estava viva e doída. Eu protelava, por isso, à ida para o hospital , esperando passar a meia-noite, querendo que meu filho nascesse no dia 26. O médico - Dr. Romário - entendeu -me e concordou em fazer a cesareana depois do "Dia do Soldado". Somente quem viveu naquele período politicamente difícil entenderá isso, que hoje pode parecer uma bobagem. Nasceu Patati com oito meses de gestação, magrinho e feio. Ficou três dias numa caixa de vidro, em meio a fios e aparelhos. Eu ia vê-lo três vezes por dia, durante alguns minutos. Sentia um medo terrível de que ele não sobrevivesse. No quarto dia de sua vida, retornamos à casa. Uma semana depois , retornei a um de meus empregos, um pré-vestibular onde eu ensinava Língua Portuguesa. Eu tinha 27 anos, tinha força e determinação. Queria ser uma boa profissional. Patati cresceu sadio, inteligente e bonito. Nunca o imaginei o adulto de hoje. Ele era apenas o menininho que eu desejava tanto, após ter tido uma menina. Os filhos crescem e se vão. Rápido demais! São tão lindos e tão diferentes entre si.

"Há pessoas a quem o arranhar das paredes impressiona
E outras que se não impressionam
Mas o arranhar das paredes é sempre igual
E a diferença vem das pessoas. Mas se há diferença entre este sentir
Haverá diferença pessoal no sentir das outras coisas
E quando todos pensem igual duma coisa é porque ela é diferente para cada um".
Fernando Pessoa

quarta-feira, agosto 19, 2009

" Lá vou eu..."


Bela União / Rosário do Sul / Porto Alegre. Alguns dias ótimos com Ary, Zeli, Juninho, Fabianinha,Pedro. Depois, Porto Alegre/São Paulo / Miami / Atlanta. Viagem boa, apesar do medo de avião. Acreditem! Eu realmente tenho medo!
Voltei "às boas"com a VARIG. Rejeitei inicialmente a fusão dela com a GOL. Sensação de perda e fracasso. Aos poucos , fui assimilando essa fusão. Consolidei-a quando o programa de milhagem passou a ser comum às duas. Tenho "cartão ouro" desde a sua criação. Já emiti dezenas de bilhetes com Smiles. Agora, melhorou ainda mais. Duas outras companhias, que eu costumo usar - Air France e a American Airlines - integram esse programa de milhagem. O Smiles me dá, além de bilhetes aéreos, acesso à sala VIP - com café, pão de queijo e internet!
De Porto Alegre a São Paulo, tudo ótimo. Uma espera de seis horas em Guarulhos já me cansou um pouco.

Logo no início do vôo para Miami, senti que teria problemas. E tive! comecei com caimbras nas pernas e , depois, dores muito fortes. Chamei um comissário de bordo e falei sobre a dor que estava sentindo. Sugeriu-me que eu caminhasse um pouco. Enquanto eu caminhava, ele "descolou"um lugar na excelente classe executiva da American Airlines. Assim que deitei, dormi profundamente - até sonhei que estava apanhando bergamotas ! Acordei sem dor e com o café sendo servido.
  


Em Miami, fiz alfândega, respondi por que havia estado no Egito este ano, mostrei a passagem de retorno e ...tudo bem.

Mais quatro horas de espera e, enfim, a conexão para Atlanta. Desci em Atlanta, maldizendo o peso da minha bagagem. De trem, fui do aeroporto à estação onde Valéria e Massimo me esperavam. Ótimo. Uma semana aqui e , depois, Atlanta / Bloomington / Pana.
PS. Impossível não fazer algumas comprinhas: liquidação de verão, preços baixos , roupas lindas, muitas novidades.Paraíso do consumo.

quinta-feira, agosto 13, 2009

Fernando Pessoa.

"Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.
Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.
A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera.
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.
Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado.
Ele dela é ignorado.
Ela para ele é ninguém.
Mas cada um cumpre o Destino -
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.
E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E, vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora.
E, inda tonto do que houvera,
à cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia."

sábado, agosto 08, 2009

"Festa de Babette"


Gosto de cozinhar. Não cozinho bem - nunca serei uma Marietinha, como dizia Luís Behares, ao me comparar com essa querida amiga, perfeita em tudo que fazia. Não sou chef ,mas cozinho com alegria, antecipando o prazer de quem vai experimentar o alimento que preparo. Penso que cozinhar é um exercício de generosidade, carinho e respeito com ao próximo. Tenho hoje um conhecimento acumulado , durante muitos anos, de dicas e de segredos culinários.



 Lembro-me, por exemplo, que foi Pithan quem, há mais de 30 anos, ensinou-me a fazer arroz soltinho: uma medida de arroz para cada duas medidas de água. Assim o faço até hoje. Eroni Carus me ensinou a fazer uma sopa deliciosa de cenoura e fígado de frango. Rolando, meu irmão por escolha, foi meu grande mestre: ele sabe cozinhar com perfeição e o faz com alegria.







Ada Emeri fez minha iniciação à legítima cozinha italiana, mais tarde complementada por Lidia - ela faz um risoto ao forno, com vinho branco, fantástico - por Franco e Carmela , com quem aprendi a fazer massas ótimas e por muitos outros amigos de diferentes regiões da Itália. Sônia , Cleusa e Ronaldo me ensinaram a fazer muitos pratos da comida árabe. Com a Kritika, vivenciei o uso de especiarias indianas e fiz um fantástico arroz com tamarindo . Aprendi, com Luís e Raquel, pratos divinos com fígado e uísque! Doces eu não sei fazer - mas sei admirar quem o faz bem. Ninguém faz uma torta Marta Rocha como Amélia Benetti; uma ambrosia como Maria Antônia ; uma torta de coco queimado como Edmea e uma torta de maçã como Regina Veríssimo. E Edmara faz um bolo delicioso - e não é de "caixinha"como os que eu faço.Inesquecíveis!


 
Meus filhos sabem cozinhar. Sou orgulhosa disso. Fico triste quando escuto alguém dizer que não sabe fazer nem arroz! Houve um tempo que essa era uma declaração de riqueza: sinal de que a família tivera sempre empregadas para cozinhar. Entendo-a hoje como uma declaração de dependência - uma pessoa que não sabe sequer preparar seu próprio alimento.








Ronald, mesmo depois que estávamos casados, repetia seu pedido de casamento quando eu fazia sopa de feijão branco ou risoto de vegetais, que ficam excelentes. Faz pouco, Valéria me ensinou uma salada de frango com amendoas torradas ou nozes, cujo segredo está no curry e na mostarda que se agregam à maionese. Engorda, eu sei. "Tudo o que é bom ( ...) engorda!" Mas vocês já foram convidados para uma alfaçada? Se bem que se pode descobrir o prazer de comer um belo prato de vegetais crus. Ultimamente, sirvo, nas saladas, couve-flor e brócolis crus, bem picadinhos.


Gosto de ir à Feira aos sábados, quando estou na cidade.Gosto de ir à horta, quando estou na Bela União. Gosto de cozinhas amplas. Gosto de pratos, xícaras e talheres. Gosto de pessoas por perto quando estou cozinhando. Gosto de elogios ...é claro!
Lembro de um filme dinamarquês, produzido nos anos 80, intitulado Festa de Babette, que enfocava a fé , o amor e o prazer de produzir e servir alimentos. Belíssimo. Não sou uma Babette, não sou uma Marietinha, não sou um Rolandinho.



Estou, entretanto, tentando ser uma cozinheira melhor do que sou. Rubem Alves escreveu : quem cozinha é parente próximo das bruxas e dos magos". Sou, por ora, um parente distante.